domingo, 30 de setembro de 2018

A Festa de Cosme e Damião que não teve Doce

 
Foto: casaogumdelei.blogspot.com
A casa toda estava em festa, tudo decorado e especialmente neste dia, haviam muitas crianças por todos os lados.
O chão era de terra batida e a parede rebuscada pelas surras do tempo, tinha dia que era marrom pelo barro seco, tinha dia que era verde pelo musgo da umidade. Ocupavam o espaço alguns bancos que gentilmente os mais novos cediam para os mais velhos. Era tudo muito simples.

O clima era de euforia contida.
Por todo ambiente era predominante o cheiro de pipoca doce. Já era tradição as doces pipocas da Mãe Maria. Diziam que tinha o poder de cura que nenhum outro doce tinha.
Logo as cortinas se abriram e o ponto de abertura foi puxado pelas crianças da casa, filhos dos médiuns em grande maioria.
As palmas entoavam um ritmo alegre de cantiga infantil.

Após as firmezas e seguranças feitas, finalmente as crianças da linha de Cosme e Damião se manifestaram. Foi, como sempre, uma explosão de alegria.
Terezinha, a Criança de Mãe Maria, pediu que buscassem os saquinhos de doce.
Mas uma certa demora começou a ser notada. Nada de virem com os doces.

"Com quem está o doce?"
"Quem se encarregou de trazer os doces?"
"Por que estão demorando?"
"Tragam os doces!" 


Foi quando notaram que Dona Nita, medium já idosa da corrente, não estava no congá e estava, como sempre esteve, com ela, a responsabilidade de embalar os doces com os saquinhos que ela religiosamente costurava em algodão, pois desse axé ela não abria mão.
Dona Nita morava um tanto longe, e ia mesmo assim, caminhando.
Mas neste dia, ela não foi.
Dona Nita não pôde levar os doces.
Porque ao preparar o seu café pela manhã, virou toda a água em seu corpo e tudo o que conseguiu fazer, foi pedir que o entregador de leite a levasse para o hospital.

Ao tomarem ciência do ocorrido, toda corrente já não tinha mais o que fazer, a festa estava acontecendo e, neste ano, não haveria doces na festa de Cosme e Damião.
Foi quando Terezinha pediu que então fizessem mais "flor de milho"(era assim que ela chamava a pipoca). E toda a assistência se deliciou. Foi uma linda festa. As crianças nem sentiram falta dos doces.

Quando todos foram embora, Terezinha voltou chorando, muito triste: " - NÃO TEVE DOCINHO! NÃO TEVE DOCINHO!!!"
E toda corrente desabou em tristeza com o choro de Terezinha.

Então, ela pediu que a levassem até o "DOCINHO". Jorge, médium da casa, explicou que os doces estavam presos na casa de Dona Nita, por ela estar hospitalizada.
Enquanto ouvia, Terezinha recolhia, soluçando, em sua caixinha de brinquedos, as pipocas que ofereceram a ela e pediu que a levassem ao hospital. "- Eu vou me comportar, Tio! Vou fazer de conta que sou a Tia Maria! "Pometo"."

E assim, ela entrou sem alarde no hospital. Quando entrou no quarto, correu para ver Dona Nita que, apesar da dor, lhe sorriu serenamente.

Terezinha pula feliz: "Tia Docinho!!!! Eu "trouxe" flor de milho pá Tia Docinho."

Docinho na realidade, era o apelido que Terezinha dava à Dona Nita. Era por esse "docinho" que ela chorava e sentia falta.

Quando se deram conta do que se referia a pequena Terezinha, todos se sentiram constrangidos e pequenos diante da lição que tiveram.

Aprenderam que nada, em ocasião nenhuma, tem de ter mais valor que o próximo.
Que doce nenhum tem importância maior, que uma corrente solidária e que o doce da vida, de faz com a fraternidade, com a alegria compartilhada.

Terezinha ensinou que melhor que muitos doces, pra ela, era poder dividir sua pipoquinha com a Tia Docinho, que sempre costurava, com tanto carinho, os saquinhos para a festa e por tantos anos, foi elo da corrente que trabalhava e, embora seu corpo já não respondesse como antes, o seu amor pela religião que ela dedicou por toda a vida, para Terezinha, era muito maior que qualquer bala.

Terezinha ensinou, que não devemos nunca dar valor maior ao material, que o importante é a união, o cuidado, a preocupação, o amor.

Naquela noite, esqueceram dos docinhos.
Mas, a menina Terezinha chorou porque esqueceram da Docinho.

E, no fim da noite, a pequena retornou pro seu Jardim, pedindo ao Papai do Céu que, mais nenhuma "Tia Docinho" fosse esquecida por Terreiro algum.

Autoria Desconhecida

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Comente conosco o que você achou da postagem